quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

NICOLÁS MADURO E SEU JOGO POPULISTA NO TABULEIRO SUL-AMERICANO


    Foto: Zurimar Campos/ Presidência da Venezuela/AFP

O agravamento das relações entre a Venezuela e a Guiana, por conta da disputa pelo território da Guiana Essequiba, torna-se mais tenso a cada dia. Mas o que está por trás desse rompante nacionalista de Nicolás Maduro a respeito de um tema que já havia sido deixado em segundo plano pelo seu próprio antecessor, Hugo Chávez? Em 2004, em visita a Georgetown, capital da Guiana, as conversas entre Chávez e o então presidente guianense, Bharrat Jagdeo, foram amistosas, e todas as questões sobre a reivindicação dessa região ficaram arrefecidas. Ainda, segundo analistas, isso fez com que a Venezuela "deixasse passar" o momento de tratar essa questão nos tribunais internacionais, perdendo uma oportunidade de chegar a uma solução a esse impasse histórico.

Entretanto, a descoberta de diversas fontes petrolíferas na costa da Guiana em 2015 trouxe à tona novamente o desejo venezuelano pela reivindicação da região do Essequibo. Coincidentemente, nesse mesmo período, assistimos a uma gravíssima crise na Venezuela, com uma inflação de 800% (dados do Fundo Monetário Internacional), aumento da fome, desemprego e desabastecimento, e, por consequência, um enorme fluxo migratório de venezuelanos para países vizinhos, Colômbia e Brasil.

O governo venezuelano, em um movimento que vemos comumente em regimes com a popularidade ameaçada, utiliza o nacionalismo e o populismo para reacender as chamas de uma disputa territorial que remonta ao período colonial. A área litigiosa da Guiana Essequiba, também chamada de território Essequibo, que por séculos permaneceu no campo do direito internacional, de repente torna-se o epicentro de discursos inflamados de Nicolás Maduro, não só pelo interesse energético da região, que se tornou um grande polo petroquímico com as descobertas de gás e petróleo, mas também como tentativa de desviar a atenção dos problemas internos do país.

Ao se concentrar nessa questão, o governo de Maduro tenta desviar a atenção pública dos problemas políticos, econômicos e de popularidade que enfrenta, criando um senso de unidade nacional em torno do conflito fronteiriço. Além disso, a perseguição de adversários políticos, como Juan Guaidó e María Corina Machado, e a pressão internacional por eleições livres no país elevaram o descontentamento de parte da população venezuelana. Uma pesquisa realizada sobre as eleições na Venezuela apontou uma forte rejeição à reeleição do presidente Nicolás Maduro e alta adesão da população à oposição.

Nicolás Maduro explora habilmente a narrativa ideológica, retratando a disputa territorial como uma luta contra o imperialismo e a influência estrangeira. Ao enfatizar a história colonial e apresentar a Guiana e as nações "colonizadoras e imperialistas" como agressores históricos, o governo venezuelano busca consolidar o apoio interno e criar uma imagem de defensor da soberania nacional. O plebiscito do último domingo (3), acerca da anexação do território Essequibo, teve baixa adesão da população venezuelana e demonstrou ser apenas mais um artifício para movimentar seus apoiadores em seu palco eleitoral.

À medida que a retórica nacionalista se intensifica, a possibilidade de um conflito armado na região torna-se uma ameaça real. A escalada das tensões entre Venezuela e Guiana levanta preocupações internacionais, com organizações regionais e potências globais monitorando de perto a situação. O governo venezuelano, contudo, parece disposto a arriscar um confronto para manter seu discurso "anti-imperialista", ainda que pouco provável, ignorando a decisão da Corte Internacional de Justiça.

O velho populismo latino-americano segue firme e forte na Venezuela, minando as instituições democráticas, questionando a legitimidade de órgãos de controle, simplificando questões complexas, apresentando soluções superficiais para problemas intricados, criando divisões entre a população, gerando uma atmosfera polarizada na sociedade, e tudo isso baseado em retórica emocional em vez de análises aprofundadas e racionais. A Questão da Guiana Essequiba é apenas mais uma "cortina de fumaça" do governo de Nicolás Maduro, na tentativa de se perpetuar no poder e desviar o foco de toda a tragédia venezuelana.